Da infância e seus detalhezinhos: pequenos tópicos de alembramento III
§ Eis que tardo mas não falho: desvendado o mistério do céu vermelho!
Qual céu vermelho?
Aquele do qual falei no post do dia 29 de janeiro, ora bolas.
Aquele em que você, leitor fiel, pediu desesperadamente para que o poupasse da tortura da dúvida, clamando por fim-de-história.
Bah, leitor ingrato, tu não fizeste nada disso. Leste o post e foste, logo em seguida, chupar um picolé (esse tempo verbal é ó-ti-mo para fazer drama)...
Mas mesmo com este seu desdém todo, resolvi pensar nos meus leitores mudos, os voyeurs de verdade, que só lêem e não comentam (shame on you, leitores mudos, deveriam dar, sempre, seu parecer), que devem estar se retorcendo de curiosidade até hoje. Sem dormir, inclusive. Devem ter arrancado a pele do rosto, já, de tanto pensar no caso do céu vermelho. Bom, este post vai para você, leitor curioso.
(Só pra ispizinhá, vou contar a história outra hora. Quero evitar a fadiga...)
(Continuando)
O céu ficou vermelho. Inteirinho. Mas não era aquele vermelhinho desmaiado, de tons irisáticos de ocaso, não. Eram apenas 4 horas e céu ficou vermelho batom. O céu, e as roupas que estavam no varal.
Até aqui vocês sabiam.
Agora, a história completa, explicada pela dona minha mãe.
Não nos lembramos em que mês, nem em que ano, exatamente. Era um dia comum de sol, desses bonitos de verdade. Inclusive, o céu estava azul, sem uma nuvinha pra contar história.
Quando deu 4 horas da tarde, o céu começou a escurecer. Foi ficando escuro, escuro, escuro... Até que parecia quase noite. Minha mãe achou que estivesse acontecendo um eclípse, ou que fosse cair a maior tempestade da paróquia. Ou que o mundo estivesse acabando. Saiu correndo para o quintal para ver o céu, estranhamente escuro. E reparou que ele não só estava escuro, como num tom avermelhado. Deduziu que fosse o fim do mundo, e correu para a rua, para ver o movimento das pessoas que, como ela, deveriam estar em pânico. E estavam mesmo. Às quatro horas da tarde, em um bairro popular, apenas existem donas de casa, crianças e, no máximo, um carteiro. Todo este povo estava do lado de fora das casas, olhando para cima, correndo para a calçada da visinha mais próxima, para perguntar se alguém sabia o que aconteceu com a tarde.
De repente, não mais que de repente (ótima fórmula para criar expectativa, esta daqui, também), começou a ventar. E a escuridão começou a passar para as bandas de Itatiba. Mas o céu não estava mais azul, e sim num luminoso tom de vermelho-batom-da-Marilin. Daí que a mulerada parou para olhar. E quase na mesma hora, as visinhas repararam que elas mesmas começavam a ficar vermelhas! Umas começaram a passar mal, teve outra que começou a gritar socorro. As mais espertas correram para dentro, para seus varais. Foi o que a dona minha mãe fez. Saiu em disparada - talvez, a mando de seu sistema nervoso simpático - já adivinhando que, se tudo mais estava ficando vermelho na rua, seus lençóis também estavam.
Enquanto isso, no meu quarto, acordava eu de meu sono infantil de beleza. Sentindo aquele cheirinho de pré chuva no ar. Ótimo, adoro chuva. Quanto mais pesada, melhor. Adorava ver minha mãe se esconder de medo dos raios em baixo da mesa, era divertidérrimo. Saí saltitante pela casa, cheguei na cozinha, pulei até a porta do quintal e dei de cara com aquilo. O resto vocês ja sabem: minha mãe chingando as ex-roupas limpas.
Mas o que aconteceu?
Simples (mas não para a cabecinha de uma micro-loira em faze de tomar mingau): uma das grandes estradas de Campinas (a dona minha mãe não lembra se a D. Pedro ou a Anhamguera) estava em reformas enormes. E a terra das reformas era vermelha. E bateu a maior ventania de todos dos tempos na terra vermelha. E o poeirão foi para o alto e avante, na direção reforma-da-pista - Itatiba, passando pelo meu quintal.
P.S.: A poeira, misturada à umidade natural do ar, fica com cheiro de antes-de-chuva, o que explicava minha alegria.
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