02/08/2003

Exmo. Sr. Carlos Saraiva, em resposta ao post anterior:

Tietê

O rio da minha aldeia
carrega meias de nylon
recolhe pernas sem meia
cabeças de degolados
pets, cascas de ferida
latinhas do feriado
fatos de porco, barracos
álbuns de fotografia
revólver de justiceiros
cadáveres desovados
sobras dos lixos do dia
mijos de dias inteiros
febre das disenterias.

Infecto-contagioso
é meu amor pelo rio
o rio da minha aldeia
que leva meias de seda
recolhe pés sem sapato
ribeirões de celulose
corações despedaçados
fígados desintegrados
pela hepatite e a cirrose.

O rio da minha aldeia
que a cada curva da estrada
entorpece-me as narinas
de emocional overdose
inspira tudo o que crio
aniquilando-me o olfato
podridão que me socorre
só corre nas minhas veias
providente e permissivo
me embebeda do seu porre
vai em frente, mata e morre
pra que eu continue vivo.

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